Chávez, para falarmos em termos maquiavélicos, contou, em boa parte do tempo, com a fortuna, e teve, na maioria das vezes, a virtu necessária aos grandes líderes políticos. Soube valer-se da maior riqueza de sua Venezuela, o petróleo, aproveitando-se das boas fases de alta da commodity, revertendo os ganhos em programas sociais para o seu povo, transformando a estrutura social do país.
Liderança regional, figura carismática, sujeito que incorporava um movimento de mudança em um país e numa região que necessitavam de profundas transformações, Hugo Chávez esqueceu-se justamente de criar condições para que o "chavismo" lhe sobrevivesse com tranquilidade.
Não há originalidade no que está aqui exposto. Tampouco se trata de opinião nova, proferida no calor do momento, na hora em que o problema de algum modo se impõe. Nada disso.
No documentário "Ao sul da fronteira", de Oliver Stone, o falecido Nestor Kirchner já contava que advertira o presidente venezuelano da necessidade de dar espaço para o surgimento de novas lideranças em seu país.
O historiador Gilberto Maringoni, especialista na matéria, em seminário do departamento de Filosofia da Universidade São Judas Tadeu, de São Paulo, em data não muito recente, expunha a ausência de nomes capazes de derrotar Chávez na Venezuela, mas se lamentava, ao mesmo tempo, de não haver outra figura, no campo do chavismo, capaz de suceder o "comandante". Asseverava ele, com misto de humor e desolação: "não existe uma 'Dilma' do Chávez!".
Mais recentemente, o ex-presidente Lula, em entrevista à imprensa argentina, em manifestação um tanto distorcida pela mídia brasileira, também declarava que Chávez precisava ter cuidado de preparar sua sucessão. A opinião repercutiu em todo o mundo, inclusive pela incontestável autoridade do brasileiro neste particular.
Antes de qualquer esperneio, cumpre esclarecer que o problema não está no modelo eleitoral da Venezuela, que permite sucessivas reeleições infinitas do presidente - embora caiba, por outro lado, crítica ao fato de a mudança constitucional que as permitem ter sido efetivada no meio do jogo, a exemplo, aliás, da que permite a reeleição no Brasil. A favor de Chávez, diga-se de passagem, está o fato de ao menos submeter ao crivo popular as alterações que implementava.
A singeleza da questão está no fato de que, a despeito de ser líder carismático clássico, o presidente Chávez, até em razão do ambiente democrático popular que a sua atuação suscitou, poderia ter ungido desde há muito o próprio Nicolás Maduro ou qualquer outro nome de seu círculo mais próximo, deixando-lhes um caminho mais suave para dar continuidade ao seu assombroso legado. Seria uma empreitada difícil? Sem dúvida. Mas Lula e Dilma, mesmo sem uma rede de comunicação forte como a de Chávez, comprovam que não seria impossível.
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