Ora, mas é claro que a greve dos professores de São Paulo é política! Em última análise, qualquer movimento paredista no seio do funcionalismo público tem, sim, cunho político. Afinal, está-se a exigir salário ou melhoria de condições de trabalho de um órgão político, de alguma instância governamental comandada por um político e assessorada por políticos.
Impossível não pensar no clássico poema "O Analfabeto político", de Berthold Brecht, de que destacamos trecho:
O pior analfabeto
É o analfabeto político,
Ele não ouve, não fala,
nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida,
o preço do feijão, do peixe, da farinha,
do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
É isso aí! Poder-se-ia acrescentar que o salário dos que ensinam nossas crianças e as condições das escolas em que elas estudam dependem, também, de atos daqueles que exercem cargos políticos, ou seja, de suas "decisões políticas".
Lembremos que mesmo em greves no setor privado, dependendo do contexto histórico, podem ser enxergadas implicações políticas. Vide as famosas greves dos metalúrgicos do ABC paulista, durante o regime militar, com vários de seus líderes enquadrados na famigerada Lei de Segurança Nacional.
Como o momento é de corrida sucessória, corre-se a afirmar que a paralisação dos professores pretende, antes de atender às demandas da categoria, interferir no processo eleitoral (o qual, diga-se, nem começou para valer). Acerca disso, aliás, o PSDB, o DEM e o PPS entraram com representação contra a APEOESP no Tribunal Superior Eleitoral por "contrapropaganda" eleitoral - seja lá o que isso queira dizer.
Aceitemos que, além da implicação política óbvia de movimento grevista de servidores públicos, possa haver também uma componente especificamente eleitoral na greve dos professores. Ora, isso não nega - sequer diminui - o fato de o estado de São Paulo pagar alguns dos piores salários para professores e apresentar dos piores índices de qualidade de ensino do Brasil. São Paulo, nos últimos anos, não vem reajustando o salário do professorado, sequer aplicando os índices de inflação oficial (prática, ademais, que vem sendo estendida a outras categorias de servidores estaduais, como é o caso dos serventuários da Justiça).
Seria fácil ao governo de São Paulo - e ao seu já ex-governador presidenciável - anular os supostos efeitos político-eleitorais da pendenga, se assim o quisesse. Bastaria aceitar a negociação e atender ao menos parte das reivindicações do conjunto do professorado, haja vista que o estado mais rico da Federação também é beneficiário dos incrementos de arrecadação observados por força do bom momento da economia nacional e teria plenas condições de conceder algum tipo de reajuste. Se o governo paulista não buscou negociar, preferindo o confronto, tudo indica que deva ser porque acredita no poder de sua campanha difamatória contra o sindicato, o que significa dizer que joga suas fichas na aliança com a mídia e seus "formadores de opinião" - além, é claro, de também apostar numa certa falta de capacidade de discernimento dos "estratos médios" paulistas.
O inteligente leitor pode até achar que seria mesmo perda de tempo sentar à mesa de negociação, pois talvez o sindicato não aceitasse migalhas, ou exigisse o "tudo ou nada" ou até estivesse só querendo fazer politicagem mesmo e, desse modo, a situação continuaria no impasse. Concedido. O governo de São Paulo, nesse caso, poderia, aí sim, dizer que teve boa vontade, fez um aceno à tentativa de negociação, mas como o outro lado só queria saber de tumultuar e "fazer política", não se chegou a um bom termo.
A estratégia de negociação acima exposta parece tão óbvia e tão mais, por assim dizer, "simpática", que torna muito assustadora - até para a democracia - a determinação de preferir o embate com os trabalhadores e de buscar a Justiça para tentar embaraçar a atuação de uma entidade representativa de classe. É perigoso... Não precisa ser uma Regina Duarte para ficar com medo!
Já imaginou se fosse na Venezuela?
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