José Sarney vem conseguindo se dar bem no Conselho de Ética do Senado Federal, a despeito do bombardeio midiático que sofre diuturamente há alguns bons meses.
Se este blogueiro não comete erros teóricos muito sérios, a ética diz respeito a valores tido como mais ou menos amplos, mas afeitos a uma comunidade, sendo, desse modo, mais voltados a preocupações gerais de conduta dentro de um grupo ou de uma instituição. Neste sentido se diferencia um pouco da moral, a qual tem a pretensão de ser universal, tendo que ser observado por cada em indivíduo e em qualquer lugar e circunstância. Isso, é claro, bem grosso modo, e certamente não de maneira muito consensual. Discussão que, por óbvio, não pode ser encampada aqui.
De todo modo, no imbróglio que ora se verifica na Câmara Alta brasileira, não se tem visto entre a maioria de seus analistas muita preocupação com a ética, pelo menos não no sentido que expusemos acima. A questão tampouco se apresenta dissecada sob o ponto de vista genuinamente moral. Tem-se, isto sim, uma onda meramente "moralista", o que é algo diverso.
A questão é bem simples. No fundo, todos sabem que os desmandos não apenas no Senado Federal, mas em muitos órgãos da República, provêm desde há muito. Sabe-se também que José Sarney tem uma longa folha corrida de “desserviços” prestados ao país e ao seu estado natal. Porém, vê-se uma repentina (e bota repentina nisso!) perseguição ao presidente daquela Casa, enquanto se faz pouquíssimo caso dos males provocados por outros senadores, em especial os da oposição, além de não haver uma autocrítica daqueles que foram no mínimo indiferentes ao senador pelo Amapá nestes anos todos de sua longa vida política.
Justiça seja feita, um pouco de preocupação verdadeiramente ética nesse caso foi percebido no comportamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e no escritor Carlos Heitor Cony. Todos eles reconhecem que há sérios problemas no Senado Federal, mas obtemperam a necessidade de não se “demonizar” ninguém de forma particular, tendo em vista que os vícios por lá são antigos, resvalam em várias legislaturas e sujam um montão de gente de todos os partidos. Há que se resolver os problemas gerais da Casa, dizem eles. E o primeiro passo é justamente reconhecer que os problemas são antigos e generalizados. Simples, portanto.
O mais curioso dessa história é que alguns colunistas afoitos andam soltando rojões por aí afirmando que pesquisas, não esclarecendo quais, apontam queda na popularidade de Lula e estagnação da eventual candidatura Dilma, isso porque estariam apoiando Sarney. Bem, conforme exposto, é desonesto afirmar que qualquer dos dois apoia Sarney. Em verdade, ambos estão realmente preocupados com os problemas estruturais históricos do Senado, o que por ma-fé midiática é apresentado como defesa de José Sarney. Seria, portanto, injusto – ainda que sintomático – que, em meio à onda moralista, os verdadeiramente éticos sejam punidos pela opinião pública! Ademais, corre à boca pequena a suspeita de fraudes em novas pesquisas do IBOPE e do Datafolha. A conferir. Aliás, por falar em ética, bem que os colunistas poderiam falar mais abertamente, dando nome e sobrenome se possível, dessas terríveis pesquisas de cujos dados eles parecem já estar sabendo.
Dois pontos para se refletir sobre o tema
A professora Yolanda Gloria Gamboa Muñoz, da PUC de São Paulo, certa feita fez interessante comentário sobre a preocupação com a ética no início deste século XXI. Ela ministrava aulas de ética nos mais diversos cursos universitários. Havia a disciplina “ética” na grade de Secretariado, Jornalismo, Medicina etc. Conjeturou ela que, se algum historiador no futuro se debruçasse sobre nossa época, poderia pensar que éramos uma geração extremamente ética. Diriam eles: “que pessoal mais ético; só falavam e pensavam em ética”. Seria um erro, disse ela. Em verdade, somente se fala e se debate muito sobre ética justamente porque falta ética. O corolário da exposição dela é a de que as comunidades tendem a se preocupar muito justamente com aquilo que não possuem. Com a palavra, os colunistas demagogos de nossos jornais!
Outro ponto: para escrever o presente post, quis dar uma conferida no que dizia Norberto Bobbio sobre “ética” e “moral” no seu famoso Dicionário de política, com o intuito de não escorregar nos conceitos. Pois bem, amigos. Pelo menos na 11ª edição, lançada pela Editora UnB, em 1998, os verbetes "ética" e "moral" simplesmente não existem! Pode ser problema da edição brasileira, embora não haja qualquer informação de que ela esteja incompleta. Pelo jeito, o grande intelectual italiano não considerou tais assuntos tão importantes assim, pelo menos não a ponto de os incluir como verbetes no seu maravilhoso dicionário. Bem, como diriam os maiores filósofos da história, “mas, enfim...”!
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