quinta-feira, 16 de junho de 2011

Justiça é justiça; política é política

O caso Palocci é daqueles que reforçam lições fundamentais. Uma delas: o tempo da justiça é diferente do tempo da política.

Não houve propriamente acusações contra Antônio Palocci. Sequer houve suspeitas, no sentido mais legal do termo. No máximo tivemos algumas ilações: se ganhou muito dinheiro, estando enredado nas teias do poder, é porque deve ter aprontado alguma, traficado influência, vendido informações sigilosas e outras tramoias.

Já o Procurador-Geral da República não viu motivos para abrir procedimento formal contra o então ministro chefe da Casa Civil do governo Dilma, pois as denúncias apresentadas por partidos de oposição não se mostraram consistentes, o que significa dizer que não provaram nada.

A imprensa que muito falou, pouco fez além de ficar cobrando o ex-ministro que apresentasse a carteira de clientes. faltou a atuação de colunistas mais virulentos, exortando os contratantes de Palocci a se revelarem e explicarem por que remuneraram tão bem o ribeirão-pretano. Certamente pensaram duas vezes antes de melindrar mega-anunciantes.

O mais provável de ter ocorrido no caso é a situação bem descrita na primeira nota divulgada pela assessoria do ex-ministro: figurões que ocupam importantes cargos na área econômica do governo federal passam a valer muito no mercado. Deveria ser o ponto final, não tivesse Palocci se acovardado e recuado da sensata explicação.

Sensata mas não moral, correriam a lembrar alguns. Não à toa foi feita a comparação com o economista argentino Raúl Prebisch. Primeiramente Paulo Henrique Amorim e em seguida Elio Gaspari lembraram que o cepalino, após ocupar a presidência do banco central da Argentina, mesmo vivendo sob dificuldades recusou a laborar para a banca privada, pois, em razão de seu trabalho na área pública, era detentor de informações sigilosas, não sendo justo que as usasse em favor de um, em detrimento de todos os outros.

O grande drama é que, respeitado certo prazo, a ninguém no Brasil - incluindo Palocci - é proibido ocupar importantes cargos econômicos no governo e depois sair vendendo a força de trabalho no mercado, a preço de ouro. Ressalte-se que a vedação não existe nem mesmo para deputados federais, que era o caso de Antônio Palocci.

Já do ponto de vista estritamente político, é difícil entender por que a presidenta Dilma Rousseff hesitou tanto em tomar alguma decisão no caso Palocci.

É notório o fato de que ela, alçada a ministra-chefe da Casa Civil em 2005, não mantinha as melhores relações com o então ministro da Fazenda. E na corrida presidencial de 2010, Palocci só foi parar na campanha da petista após imbróglio que provocou a queda de Fernando Pimentel, amigo dela de longa data.

Palocci participou da campanha de Dilma e integrou o governo dela porque teria bom relacionamento com o chamado mercado e com grande parte da imprensa. Era homem que inspirava confiança e trazia tranquilidade aos agentes econômicos - e mesmo a alguns políticos da oposição.

O mesmo trânsito Palocci parecia não encontrar, porém, entre seus correligionários do PT ou junto aos simpatizantes do partido - e decerto não o tinha, em sua plenitude, com a própria Dilma Rousseff.

A presidenta não precisava tê-lo entregue às feras, é bom que se diga; e nem deveria, haja vista que, como dissemos, não há acusações concretas contra o ex-ministro. Mas ela poderia, sim, tê-lo afastado preventivamente, sem alardes que implicassem reconhecer culpas, como forma até de poupar e preservar seu "superministro" - neste status mais por força das circunstâncias, reitere-se, do que por vontade dela.

Não seria o caso de se deixar pautar pela imprensa, tampouco de capitular ante o neoudenismo, como poderiam acusar alguns. Dilma estaria apenas jogando para escanteio um caso que desde o início já aparentava não ter fôlego, matando o factoide no seu nascedouro.

Após o parecer do Procurador-Geral, Dilma teria a opção de reintegrar o ministro, se assim o quisesse, ou - melhor ainda - aproveitar o ensejo para afastá-lo definitivamente da Casa Civil, botando de pronto no tão importante ministério alguém que fosse realmente de sua vontade, não um mero "fiador" junto à imprensa e ao mercado. A presidenta teria evitado riscos de desgaste a sua imagem e a de seu governo e, ainda por cima, teria conseguido tirar de sua sala contígua, sem riscos de crise, o "infiltrado" da imprensa e dos rentistas.

O sangramento foi totalmente desnecessário. E, neste caso, faltou a Dilma capturar o timing político do imprevisto. Foi justa, mas inábil.

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