domingo, 24 de julho de 2011

Inflação: política e economia

O factoide inflação continua rendendo – com ou sem trocadilhos, você decide!. Começou como mero jogo político capitaneado pela oposição e pela mídia, passando, num segundo momento, a sofrer exploração da turma da economia-finanças – nesta etapa, também com o apoio do oligopólio midiático.

Já no fim de 2010, e especialmente no início de 2011, as figuras de oposição – e tanto faz falar de jornalistas ou políticos – passaram a dizer que vivíamos um clima de descontrole inflacionário. A estratégia parecia ser a de colar em Lula a responsabilidade por certa “herança maldita” legada ao País, e, neste caso, uma herança particularmente maléfica para a população mais pobre, não por acaso justamente os maiores apoiadores do ex-presidente. Alegava-se certo afrouxamento do pernambucano no combate ao “dragão”, que, por sua vez, teria sido alimentado pelo abuso nos gastos públicos dos últimos anos com o fim de ajudar sua candidata à sucessão.

O ano de 2010 fechou, com efeito, com inflação acima do centro da meta (5,91% contra 4,5%), ainda que abaixo do limite superior de tolerância, que era de 6,5% ao ano. Nunca é demais lembrar que em seu último ano, 2002, o presidente Fernando Henrique Cardoso entregou a Lula um País com 12,53% de inflação. É bom não se olvidar também que, durante a corrida presidencial do ano passado, a então candidata Dilma Rousseff trouxe à baila o assustador resultado do ocaso do ex-presidente tucano, vindo a sofrer desautorizações e censuras de colunistas da grande imprensa, assim como de um ou outro luminar dos partidos oposicionistas.

Esquecendo-se dos detalhes acima, explorou-se nos últimos meses o tanto que deu – e na medida do necessário – o assunto inflação, de modo a quase transformar o Brasil na Alemanha pré-nazista. Chegava a ser engraçado ouvir âncoras de rádios noticiosas reportando-se aos tempos da hiperinflação de Sarney, enquanto se esqueciam de mencionar o preocupante resultado do ano de despedida de FHC!

Mas o tópico inflação foi aos poucos esfriando do ponto de vista político. O primeiro motivo talvez tenha sido o de que não daria para martelar muito no tema, em vista das reiteradas informações de que o pequeno repique de preços iniciado em fins de 2010 devia-se, sobretudo, ao elevado valor das commodities, ou seja, não tinha muita ligação com fatores internos, tanto que diversos países vinham – e vêm – sofrendo com aumentos nas prateleiras.

E, muito melhores do que a “dura realidade” do parágrafo anterior, vieram histórias que mexem com o ânimo neoudenista não somente da oposição (política e midiática) mas também da classe média – mais sobejamente a tradicional – dos grandes centros urbanos. Trata-se do factoide Palocci e do escândalo do ministério dos Transportes. Com tais “combustíveis” em mão, capazes de acender o fogo do moralismo seletivo de importante contingente da população brasileira, torna-se bobagem brigar com fatos, querendo convencer o povo de que ele estaria vivendo o pior quadro inflacionário desde o início do Real, quando se sabe que isso é uma mentira deslavada.

Ora, dirão alguns, a coisa não parece estar rolando bem assim, haja vista os aumentos de juros, as declarações defensivas de ministros da área econômica e as falas cautelosas da própria presidenta Dilma. Pois bem: é aqui que entra o trabalho bem feito do pessoal da economia-finanças, ou, se preferir, o tal “mercado”.

É simples: os “mercadistas” querem juros. Viram no terrorismo inflacionário a oportunidade de não ter, sob novo governo e nova direção do Banco Central, o esperado estancamento da elevação contínua de juros. E para tal mister a mídia lhes serve com a mesma dedicação que normalmente presta para a oposição política.

O IPCA de maio e de junho tiveram quedas significativas. No entanto as pressões para se aumentar os juros soaram forte aqui e ali, tanto que a SELIC recebeu mais 0,25% nesta semana.

A imprensa, sempre prestativa, estampa em suas manchetes o acumulado da inflação de 12 meses, apontando-o como número acima do extremo da meta de 6,5%, deixando, contudo, de esclarecer que o BC não se compromete com resultados dos últimos 12 meses, mas sim com o consolidado do ano, ou seja, trabalha para não ultrapassar os 6,5% de inflação no ano de 2011.

A mídia esconde também que de junho a agosto de 2010 a inflação foi muito próxima de zero. Desse modo, no cálculo do acumulado de 12 meses está-se subtraindo zero e acrescentando qualquer resultado positivo, mesmo que baixo, que se venha atualmente apresentando, o que obviamente empurra para cima o somatório do período. Situação inversa pode ocorrer nos últimos meses deste ano: de outubro a dezembro do ano passado os índices estiveram sempre acima de 0,60%; possíveis resultados menores no mesmo período em 2011 inevitavelmente trarão o acumulado para baixo.

Em resumo, a inflação não traz riscos mais sérios, como já bem perceberam os políticos oposicionistas, muito mais empolgados com suspeitas ou escândalos de corrupção do que com as estripulias de um dragão que, embora desperto, continua bastante calmo no seu canto.

O pessoal do chamado mercado, porém, não pode deixar escapar o “diamante bruto” que a guerrinha política lhe jogou no colo. Não obstante as provas de que não há maiores riscos inflacionários a se considerar, o assunto não pode esmorecer, para que continuem a faturar com a farra dos juros.

Num e noutro viés, temos a mídia sempre dando suporte. Num e noutro caso, vemos o País sempre perdendo.


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O inflacionado mercado das mentiras

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