No polêmico caso envolvendo advogada brasileira na Suíça há um aspecto que deveria ter sido mais bem analisado pelos interessados no assunto, mas que foi ocultado, principalmente na grande imprensa – aliás, por motivos óbvios, o leitor logo o verá. (verdade seja dita, porém, o blog Cidadania.com não deixou de anotar o elemento que será aqui explorado).
Numa de suas primeiras reações, a imprensa do país europeu criticou duramente as autoridades brasileiras por sua precipitação, mas foi especialmente enfática em apontar o que se pode chamar de mau-caratismo da mídia brasileira, que, segundo ela, é dada a mentir, a inventar coisas, a destruir reputações, a cometer injustiças de toda espécie.
Antes de prosseguirmos, uma questão: há muita gente aí que se oporia a essas assertivas dos suíços em relação aos meios de comunicação de nosso país?
A imprensa brasileira sempre embarcou com muita facilidade em canoas furadas. Esqueça-se da Escola Base, amigo leitor, caso emblemático da pressa e da falta de diligência dos meios de comunicação brasileiros. Pense noutros: Alceni Guerra, Freud Godoy, caso da mãe que teria colocado droga na mamadeira, caso Júlio Lancelotti, a história do escrevente que teria matado os pais em São Paulo etc.
Aparentemente a mídia se recusa a refletir sobre seus erros. Ela deveria ver no “desabafo” de seus pares suíços mais um motivo para repensar sua situação e seu modo de agir nos últimos tempos. A coisa anda tão feia para o lado dos meios de comunicação no Brasil, que, de poucos anos para cá, todos se sentem relativamente à vontade para tratá-los como saco de pancada - nalgumas oportunidades com a mais pura razão, noutras com alguma dose de cinismo. Vejamos alguns casos.
Quem não se lembra de texto do filósofo Mangabeira Unger na Folha de São Paulo acusando o governo Lula de ser o mais corrupto do Brasil republicano? No entanto, ao aceitar cargo no mesmo governo, o descarado intelectual saiu-se com a desculpa de que somente fizera aquelas declarações porque havia sido mal informado pela imprensa brasileira. Como bem lembrou Alberto Dines, em interessante texto publicado no Observatório da Imprensa, Mangabeira colocou a Folha, jornal do qual era colunista, em má situação, pois não dava para imaginar que o professor, então morador dos Estados Unidos, fosse buscar notícias sobre o Brasil na concorrência. A pergunta básica é: o hoje secretário com status de ministro do governo Lula teria coragem de arriscar tão absurda saída olímpica se sentisse que a imprensa gozava de um mínimo de prestígio entre a população brasileira? Certamente não. Mangabeira, para tornar menos cínico o seu ingresso no governo que criticara da mais dura maneira imaginável, aproveitou-se, em verdade, da absoluta antipatia que a mídia já vinha provocando em boa parte da opinião pública.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também não deixa de dar suas cutucadas na imprensa de quando em vez. Há algum tempo provocou a ira de colunistas, sugerindo que a imprensa era culpada de boa dose da violência que se verificava no país, por conta da sua opção preferencial por notícia ruim e por desgraças de toda magnitude. Recentemente, na famigerada entrevista à revista Piauí, o presidente brasileiro chegou a antecipar o teor da bronca publicada na imprensa suíça. Disse ele: “a única coisa que eu lamento profundamente é que quando acontece a publicação de uma mentira, quando vem à tona que aquilo era mentira, não seja publicado do mesmo tamanho o desmentido. (...)Quando você é condenado, você já foi condenado previamente. Quando você é absolvido, isso não aparece ”. Num país em que a imprensa fosse respeitada, o chefe de Estado teria que pisar em ovos ao dar tais tipos de declaração, mesmo sendo elas a mais absoluta verdade.
Mediante tais exemplos, é de se estranhar que a imprensa brasileira seja incapaz de fazer o mínimo de autocrítica e de ser mais cuidadosa com os seus métodos. E o caso Paula ajuda a mostrar que o problema não é de má vontade por parte de políticos magoados com críticas ou de protoditadores que querem silenciar a liberdade de expressão. Dessa vez ficou demonstrado que a má qualidade do jornalismo praticado no Brasil já conquistou fama internacional. Certamente, os suíços não disseram o que disseram da nossa mídia por acaso.
Não é sobre liberdade (e eles sabem disso)
Há 5 semanas
Nenhum comentário:
Postar um comentário