Pequena reviravolta no caso Folha-ditabranda-Comparato: o diário paulistano chamou Fábio Konder Comparato, professor da USP, de cínico e mentiroso por se mostrar indignado com a utilização do termo ditabranda em referência ao regime militar brasileiro, enquanto se mostraria simpático a regimes ditatoriais de esquerda, como seria o caso de Cuba. Porém, o blog do Rodrigo Vianna trouxe nessa semana missiva, publicada no Painel do Leitor de 1º de junho de 2004, na qual o jurista fazia críticas à situação da democracia e dos direitos humanos na ilha centro-americana. Leia:
"O professor François Chesnais ("Ruptura radical" é a saída para o Brasil, defende professor francês", Entrevista da 2ª, 31/5) tem dado uma excelente contribuição à causa do mundo subdesenvolvido ao mostrar, em seus vários livros, de que forma a globalização capitalista, comandada pelos EUA, aprofunda a divisão entre ricos e pobres até dentro dos países mais ricos do planeta. Mas, ao apontar em sua entrevista a experiência política cubana como exemplo a ser seguido pelos países subdesenvolvidos, especialmente o Brasil, o ilustre professor prestou um desserviço àquela nobre causa. A mundialização humanista, pela qual lutamos, funda-se no respeito integral à democracia e aos direitos humanos, caminho que, infelizmente, não tem sido seguido pelo governo cubano." Fábio Konder Comparato, professor titular da Faculdade de Direito da USP (São Paulo, SP)
Desde a primeira hora foram muitos os que não apenas se indignaram com a debochada expressão utilizada pela Folha de São Paulo, mas que se revoltaram com a grosseira resposta não apenas ao professor Comparato mas também à sua colega Maria Victoria Benevides. Inúmeros blogues saíram em defesa dos professores, porém comprando a tese de que eles realmente simpatizavam sem reservas com o regime cubano. Os argumentos em geral eram bons: alguns afirmaram que o fato de simpatizar com Cuba não tira o direito de quem quer que seja de assegurar que houve uma ditadura militar de fato no Brasil; outros asseveraram que, na condição de brasileiros, os professores estavam mais preparados – e com maior autoridade – de fazer críticas mais abertas e francas aos anos de exceção no Brasil do que às ditaduras de outras plagas; e até o autor destas maldigitadas tentou pegar a falta de razoabilidade lógica na deseducação da Folha, modestamente lembrando o arrogante jornal que é impossível afirmar que o “sentimento” de outrem, coisa absolutamente subjetiva, é mentiroso (você me diz que está triste e eu, que não estou no seu cérebro, simplesmente digo que é mentira e tudo bem!).
Mas há lições a se tirar de tudo isso.
Apesar da análise fria e crítica que se faz hoje da imprensa, mesmo com a certeza de que os jornais não são confiáveis e não obstante a postura arrogante dos jornalistas e de seus patrões, nós,os seus críticos, simplesmente aceitamos a afirmação da Folha de que Fábio Konder Comparato era um apologeta cego do que ocorre em Cuba, ou seja, demos-lhes altíssima credibilidade mesmo sabendo que eles não merecem praticamente nenhuma. É sinal de que a imprensa ainda tem o poder de repetir a mentira e transformá-la em verdade, levando no bico até mesmo aqueles que sabem ser necessário, no caso da mídia tupiniquim, viver com o “desconfiômetro” sempre ligado.
Observe-se que no ato convocado pelo Movimento dos Sem Mídia em 07-03-2009 ninguém, que me lembre, fez discurso indicando que a Folha, ela sim, era mentirosa, pois afirmava que o professor jamais se opusera ao regime cubano, quando em verdade o próprio jornal já publicara cartas do jurista com críticas a Cuba. Ressalte-se também que o próprio professor Comparato não veio a público para apontar o mau-caratismo do diário dos Frias.
“Deu na Folha!”. Bem sabemos que isso não é motivo para se levar algo tão a sério. Agora, mais do que nunca, é preciso ter um pouco mais de diligência e, antes de qualquer coisa, já ficar com um pé atrás com os arroubos agressivos tão impunemente lançados pelo jornal. Quando se ouvir “deu na Folha”, fique esperto! Se for o caso, é bom pôr o Google e outros mecanismos de busca para funcionar...
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