Muitos foram dormir sem saber que existia “uma” Ossétia do Sul; no dia seguinte, ouviam a imprensa referindo-se à região como se estivesse falando de Catanduva, Sete Lagoas, Resende, Campos Mourão, Viamão, Mossoró, Itabuna etc. Noutras palavras, a mídia pretendia nos fazer acreditar que a Ossétia do Sul seria um lugar que não chega a ser São Paulo, Nova York, Manchester, Karachi, Johannesburg etc., mas que seria logo lembrado, ou pelo menos não-estranhado, pela maioria de que dela ouvisse falar.
As informações sobre o conflito que envolve a Rússia e a Geórgia, especialmente na TV, vieram desacompanhadas de alguma explicação sobre suas motivações. A imprensa escrita e alguns sites ainda que pretenderam demonstrar as possíveis implicações geopolíticas da peleja, indicaram o status legal da região e não negligenciaram o substrato econômico da briga, tendo em vista interesses de Rússia e Estados Unidos por uma região que pode ser estratégica para a distribuição de petróleo – até de reaquecimento da guerra fria foi falado.
Mas a BandNews, com o atraso de alguns dias, resolveu fazer um “entenda o conflito”, e ganhou um ponto para a televisão ao tocar num tema que ajudaria o brasileiro médio a compreender as idéias de nacionalismo e separatismo que tanto povoam o noticiário internacional em geral e o caso da Ossétia do Sul - e também da Abkhasia - em particular. Vários confrontos são deflagrados ou sustentados por levantes nacionalistas e separatistas sem que as pessoas consigam entender exatamente o que ocorre e o que está por detrás deles. O trabalho da editoria de internacional da Band foi feliz ao explicar que "a maioria dos moradores da Ossétia do Sul se sentem bem mais ligados à Rússia do que à Geórgia".
Pertencimento: seria essa a expressão indiretamente tocada pelos jornalistas do Grupo Bandeirantes. O conceito de “nação” depende muito dessa idéia. Eu sou de uma nação à medida que me sinto como “pertencente” a ela. No caso do Kosovo, por exemplo, a maioria albanesa da região não se sentia como “pertencendo” à Sérvia; a minoria sérvia do Kosovo, por outro lado, não via motivos por que não “pertencer” à Sérvia e não se sentia, definitivamente, como “pertencente” ao Kosovo.
Mas é claro que tal idéia de pertencimento vai ficar num segundo plano para as grandes potências e para os grandes blocos, que preferirão ver quais as vantagens que podem tirar de uma dada região, sobretudo se ela for rica em minérios ou petróleo! Já as populações dos lugares de disputas nacionalistas e separatistas talvez passem ao largo da preocupação com suas riquezas naturais e com suas condições de sobrevivência e crescimento autônomos, antes se lançando à briga, nas palavras de Eric Hobsbawm, do “nós” contra os “eles”, sem se ter muita certeza do que “nós” temos de diferente “deles”.
Como diria o Paulo Henrique Amorim, a dona Maria, lá da Ossétia do Sul, apesar de estar dentro do Estado da Geórgia, sente-se russa e não georgiana, e daí vêm as idéias de separatismo. Depois disso vêm os senhores da guerra, preocupados com a política, com o poder, com a economia, aproveitando-se da situação, calculando o que se pode ganhar com um possível redesenho da região, além de um Atlas geográfico atualizado. Este foi mais ou menos o jeito que o BandNews explicou o conflito. Talvez tenha ajudado a nós, os leigos, a entendê-lo um pouquinho melhor!
Não é sobre liberdade (e eles sabem disso)
Há 5 semanas
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